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Olá Pessoas!

Primeiramente, gostaria de me desculpar, pois já faz quase um mês que não publico nada por aqui, o mês de Dezembro é corrido, e junto a isso eu estava desenvolvendo uma ideia de matéria aqui para o blog, e passei uma boa parte do mês trabalhando para tornar essa matéria possível. Então deixo aqui minhas sinceras desculpas!

Bom, segue a baixo, uma entrevista que fiz. Tive a ideia de fazê-la para mostrar que a realidade é tão ou mais assustadora que qualquer ficção ou mesmo que qualquer creepypasta. Conversei com a Camila, a Poderosa Chefona do blog (risos), e ela gostou da ideia, então comecei a buscar o material para a entrevista, e trabalhei por alguns dias, até conseguir uma entrevista com um usuário de crack.

O material que consegui creio que ficou bom, porém, em algumas questões que eu achei que poderiam render bastante, não foram tão produtivas, mas em compensação, em algumas pontos que pouco esperava saíram coisas que quem não presencia, fica difícil de acreditar.

Outro detalhe, peço a compreensão de todos, pois não sou jornalista, e as questões não são as que lemos em jornais e revistas, mas questionei situações que me parecem válidas.

Outro detalhe que acho válido frisar, como o entrevistado mesmo diz que está dominado pelo vício, e enquanto eu o entrevistava, pude notar que ele estava usando isso como um desabafo, pois como vocês vão ver nas linhas que se seguem, ele é um viciado diferente, pois tem algum conhecimento. 

Mas infelizmente o vicio em crack é mais forte que ele.


***

Segue a Entrevista:


Você está aqui para responder tudo por livre espontânea vontade? está tranquilo para fazer isso? Quer começar a responder agora?

- Sim.

Qual é a tua idade?

39 anos.

Com qual idade começou a usar drogas?

- 14 anos exatamente.

E o que levou a isso?

- Devido a um trauma que  tive aos 9 anos de idade, a separação do meu pai e da minha mãe que me chocou muito. Pior coisa que eu vi na minha vida foi ver meu pai com outra mulher e minha mãe com outro homem. Depois disso fui morar em Caxias do Sul lá tinha um tio que era traficante. Fui apresentado à cocaína com 14 anos de idade, ele me levava em zona do meretrício, depois ele começou a me cobrar o que eu usava, então virei michê. Andava com doutoras, com Radialistas, com donas de empresas. Ele tirava dinheiro das minhas costas, ganhando muito dinheiro, então eu me prostituía para conseguir a minha droga de preferência que era cocaína na época de 1994.

(Meretrício = Regiões de prostituição / Michê = aquele que se prostitui)

Como é que foi a primeira vez que usou? Como foi a ocasião?

- A ocasião foi quando o meu tio entrou no quarto com uma vadia, e deixou toda droga em cima do armário e eu peguei uma colher de uma 'grama' botei num prato. Eu via como eles faziam, esmagavam e preparavam ela antes de cheirar. Cheirei uma linha de aproximadamente umas duas 'gramas'. O que eu posso dizer, a reação que me deu foi a seguinte: A primeira coisa foi me sentir mal, coração acelerou, me deitei, então eu não conseguia fechar meus olhos, não conseguia engolir a saliva, fechou a garganta, então me apavorei passei água na cabeça mas não adiantou. Depois de 2 horas, mais ou menos, já me deu vontade de fazer de novo. Então ele já tinha saído do quarto e eu não pude fazer. Fiquei com vontade de fazer e usar de novo.

E a sensação da primeira vez, se lembra?

- É que a primeira vez a gente não sabe, não conhece o que a cocaína faz. No meu caso só acelerou o coração e fechou a garganta, não consegui engolir a saliva. Mas depois que eu fui acostumando com o efeito da droga, é uma sensação de Êxtase total, prazer total, sensação de poder fazer tudo, de matar, de sair e dirigir a 200 km por hora, sensação do super-homem. É assim e depois dos 10 ou 15 minutos que cheirou a linha de cocaína vem à depressão e a vontade de fazer qualquer coisa para conseguir mais. Isso já em um estado crítico do vício, da depressão, da dependência química.

Qual é a tua opinião, com a idade você tem agora, daquela época? Se tivesse aquelas oportunidades, como é que é que ia reagir?

- Eu ia fugir! Eu ia ser totalmente ao contrário do que eu sou hoje. No caso eu ia eu ia lutar para que os jovens não entrassem nessa vida.

Com 14 anos você entrou e como eu já te conheço há algum tempo, sei que teve um tempo em que saiu das drogas, mas depois voltou. Podia comentar como é que foi dos 14 anos até que idade você usou antes de parar?

- Comecei com 14 e usei até os 24. 2004/2006 eu parei já entrei para o CAPS que é Centro de Atenção psicossocial São Sebastião do Caí. Fiz três cursos de redução de danos, sou redutor de danos, trabalhei com a dependência química e com redução de danos. Fizeram uma experiência comigo, contrato de 3 meses, naquele tempo então eu fiz um filme da minha vida. Que não foi completado, Príncipe ***** era o nome do filme. Não Foi completado. Isso foi em dezembro de 2014, a coordenadora do CAPS falou para mim que, se eu passasse e não recaísse os três meses eu ia me efetivar e eu ia começar a ganhar R$ 4600,00 por mês, até então ganhava R$ 3200,00 por mês. Me mantive limpo durante um ano e oito ou nove meses, mais ou menos. Antes disso, antes de cair, eu fiquei dois meses e meio no CAPS e recaí. Foi onde fiz os cursos de redução de danos e recaí e não consegui passar o contato do CAPS.

E nessa recaída, qual foi o gatilho dela?

- O que levou a recaída foi calcinha! Prostituta!

Você estava namorando alguém ou simplesmente o ato, a empolgação?

- Eu tinha mulher, mas a minha vida se tornou pacata, uma rotina de casa trabalho, trabalho-casa. Trabalhava até em sábado e domingo. Tinha três empregos, trabalhava numa firma de calçado como serígrafo, trabalhava numa firma de comunicação visual como letrista, pintor letrista e tinha um pet shop onde dava banho e tosava cachorro. Então num final de semana eu tinha bastante dinheiro tipo uns R$ 2000,00. Peguei tirei todo dinheiro do aluguel, do Pet, salários todos e fui para a zona do meretrício e recaí, desta vez com o crack. Aí eu vim a conhecer o crack. A pedra.

Você usou só cocaína e crack? Ou já experimentou alguma outra coisa?

- Eu já usei o 'loló' (solvente), cola de sapateiro, mas tudo junto da maconha e cocaína, e só depois o crack. Quando parei por um tempo larguei cocaína, maconha e os outros tudo. Mas quando recaí, usava droga e tomava medicação para dependência química. Tomava 4 Amplictil, duas carbamazepina, dois carbolitium, dois respiridona para alucinação pois eu via vultos e escutava vozes, três Diazepam de 10mg para dormir de noite. E, além disso, tudo, em cima de toda a medicação, ainda usava a pedra, o crack.

Dá para ver que você toma, ou tomou uma grande variedade de drogas, entre licitas ou ilícitas, então poderia dizer a diferença do efeito entre o crack e a cocaína?

- O efeito da cocaína é forte, ela acelera, ela libera endorfina. Se comparado à cocaína libera 10% de prazer da endorfina, o crack libera 1500% de prazer de endorfina. Só que o efeito do crack, quando está derretendo a pedra no cachimbo, em cinco segundo ela ta fazendo efeito. Puxou a fumaça, prensou ali para segurar nos pulmões e as propriedades químicas serem absorvidas, dá o efeito de mais ou menos uns 30 segundos, mas a depressão do pós efeito do crack é ruim demais. Da vontade de se jogar, de chorar, de tudo. Existe três tipos de viciado, o casual, o habitual e o crônico. No meu caso eu já sou o crônico.

Qual foi a pior coisa que fez para conseguir a droga?

- Uma coisa que eu lamento muito, que eu fiz para conseguir droga foi que meu avô que era brigadiano (policial militar), no dia que meu avô morreu, meu tio pegou e escondeu a arma dele. Eu tava trabalhando como serígrafo na fabrica de calçados, e sai fugido do trabalho e não fui ao velório de meu avô, mas invadi a casa de meu tio, em busca da arma, revirei toda a casa e quebrei tudo, na fissura pela droga, mas não a achei, mas encontrei um grande saco com moedas. Eu acabei não vendo o meu avô no caixão e nem ele ser enterrado. Isso foi uma das coisas que fiz, e me deixou triste pois esse meu avô tentava me ajudar muito, ele realmente gostava muito de mim. E esse é uma que eu tenho coragem de dizer.

Além desse roubo na casa de teu tio, o que mais você faz para conseguir o entorpecente? Vou ser franco, pois te conheço há algum tempo e sei que você conversa muito bem, tirando essa parte da falácia, de conversar até convencer as pessoas, o que mais você fez ou faz para conseguir dinheiro? Um exemplo do que quero saber é o que falou no começo, onde disse que chegou a ter de fazer para o teu tio lá de Caxias, então fora isso, quais as piores coisas que já teve que fazer, que teve que se submeter por causa do vício? O que a vontade de usar foi tão grande, que no desespero você chegou a fazer?

- Eu roubava de mim mesmo, roubei da minha própria mãe. O que eu faço de mal até hoje, eu tenho um pouco de conhecimento com as palavras, para enrolar. Eu engano muitas pessoas para conseguir o dinheiro. Mentira é uma coisa que é rotineira na minha vida, para conseguir o dinheiro. Mentiras que eu conto de não ter o que comer em casa, e ao ganhar coisas para comer, eu negocio.

Por às vezes falta coisa na minha casa de comer, a minha mãe não é aposentada ainda e eu pego as coisas que eu ganho e vendo ou troco tudo por droga. Tudo porque eu estou no extremo do vício! tô derrotado mais uma vez! Eu tenho 39 anos e 72 internações! já tive em 72 vezes internado em comunidades terapêuticas, em hospícios, psiquiatrias, manicômios.

Tem como falar um pouco deste teu mundo? Não só os das internações, mas sim do submundo das drogas, pois como conversamos em off, esse é um ambiente hostil, onde qualquer passo em falso pode-se cair em alguma “armadilha”.

- Eu me acostumo. Já me acostumei com essa vida, com essa rotina. Mas eu vejo muita coisa errada e muita coisa que me deixa sentido, porque a maioria das pessoas que vem buscar a pedra onde eu me encontro hoje, não merece viver assim, por que só fazem mal para eles mesmos, não fazem mal para ninguém só fazem mal para eles.

Hoje me encontro em boca de trafico intenso, ajudando um deficiente físico por pedra, e ali eu vejo muita gente boa que mesmo não prejudicando ninguém, tem de lidar com coisas muito erradas, porque eu vejo que isso é errado. Não tem muitas coisas boas ali, a maioria é coisa muito errada. Aí é difícil de dizer, só o que eu temo, são pelas crianças, pois todas as que ali estão já estão entrando pelo mesmo caminho errado.

'É realmente triste, um futuro ali é extremamente complicado, eu conheço o local e realmente  onde a esperança  é quase zero. É um local onde pais ensinam crianças a serem dissimuladas, e as usam para se proteger, sendo usadas como “aviõezinhos”, outras que infelizmente já partiram para o lado do roubo, tem adolescente, que acho que não tem 15 anos, se vangloriando por coisas que na realidade deveria ter muita vergonha. Mas esse não é bem o foco da entrevista.

Então vamos passar para o seguinte, você falou que já teve várias vezes internado, você tem ainda alguma esperança de sair dessa vida?

- Com certeza! eu sempre digo assim: eu tenho 39 anos, 72 internações, mas não desisti da minha vida ainda! Vou esperar passar esse final do ano vou fazer uma desintoxicação física, mental e espiritual. Vou passar 30 dias de uma psiquiatria, depois em uma comunidade terapêutica onde eu vou realizar um trabalho que ficou pela metade. Quero divulgar o trabalho das comunidades terapêuticas, tem gente que não sabe o trabalho das comunidades. Neste meu caso vou para uma fazenda, no caso o tratamento é de 9 meses. Os internos tem tratamento, tem higiene, tem amor. Tem que mostrar para a população que em comunidades terapêuticas registradas pela Federação Brasileira das Comunidades terapêuticas, tem atendimento psiquiátrico, psicológico, tem dentista, tem hora de banho, tem alimentação saudável, tem laborterapia, que é trabalho para ocupar o tempo e produzir para nos sustentar. No caso a comunidade terapêutica está sempre em constante evolução de nível mental, espiritual e físico. Trabalha muito a religiosidade e o trabalho. Então quero entrar para divulgar como é o trabalho da comunidade e ao mesmo tempo, eu me cuidar e me tratar. Pretendo ficar 9 meses a 1 ano em regime fechado.

Mas devo dizer que quem quer se curar busque um local sério para se tratar, pois ontem mesmo um amigo meu que é bem conhecido na nossa cidade, que ficou uns três anos limpo, então virou pastor da Igreja Evangélica, mas recaiu,e não contou a ninguém, mas eu vi ele ontem aqui na boca de fumo pegando R$ 100,00 de droga. Não adianta eu dizer que eu vou lá e por isso vou parar para sempre, que vou sair dessa vida, porque na realidade isso não é assim. A gente só apaga a vela, mas ela está ali querendo reascender. Eu só apago a vela, mas a doença não sai do corpo. A dependência química não tem cura, ela tem tratamento. Então a gente tem que se policiar depois, porque com certeza não vai ser minha última pedra depois de passar o final de ano, com certeza vou fumar mais só que eu tenho que fazer um tratamento porque só quem sente na pele sabe, é muito difícil sair, porque a vontade não sai da gente, não sai mesmo.

Realmente acredito, pois se for analisar, você começou aos 14 anos, depois ficou dois anos limpo, se somar são 16 anos, hoje você tem 39 anos, então mais da metade de sua vida se passou dentro do vicio, deve ser muito difícil para desintoxicar, para limpar o organismo e perder essa vontade.

- Realmente é muito difícil!

Você consegue lembrar-se de algum sonho que  tinha antes de começar o teu vício?

- Ser policial militar, igual meu avô! A minha vida foi uma sucessão de acidentes, minha mãe queria que eu fosse médico, meu avô queria que eu fosse oficial da Brigada Militar. Com 8 anos tinha idade era para ir para escola militar, mas minha mãe não deixou eu ir, queria que eu fosse Doutor. Então depois que o meu pai e minha mãe se separaram, quando eu estava com quase 9 anos, aos 10 ou 11 anos eu me envolvi com um homossexual, fiquei 3 anos com esse homossexual, com 14 anos minha mãe me mandou  para Caxias pois ela descobriu que eu tinha um caso com um homossexual rico, e mandou para Caxias do Sul, onde eu fui para casa do meu tio que era traficante como eu já contei.

Infelizmente por motivos familiares teus sonhos não tenham acontecido, Mas creio que teu sonho de agora seja a saída do vício, ou não?

- É um sonho que eu estimo muito! Quero uma vida limpa, sadia, com trabalho, com família, com uma mulher!

Eu gostaria de saber também o sonho mesmo, não as tuas metas de vida, mas sim o sonho que você tem ao encostar a cabeça no travesseiro, pode me contar algum sonho de antes do vicio, e um depois?

- Lembranças eu não tenho, porque a droga deixa a gente tão louco, e como eu já disse, tomo respiridona para alucinação e meu respiridona acabou. Então não são sonhos, são delírios, de constante drogadição, pois eu estou sempre no meio da droga, revólver, morte e Demônios, escuridão! É pura alucinação, eu já vi demônios me puxando e via até o diabo em sonho ou não.

Então você chega a ter momentos em que não consegue distinguir o que é um sonho do que seria realidade?

- Não, não consigo distinguir! Mesmo com os olhos abertos eu vejo vultos, escuto vozes. Já tô desenvolvendo um quadro de esquizofrenia devido ao uso da pedra!

Como é sua rotina, como se organiza? Em relação a higiene, alimentação, como passa o seu dia?

- Eu me acordo exatamente 13:30 para chegar 13:45 numa lanchonete pegar uma marmita de comida que eles dão para mim, eles dão essa marmita para mim por eu varrer e lavar a calçada e recolher o lixo para eles. Eu pego essa marmita de comida para trocar por  pedra! Às 14 horas eu uso a primeira pedra do dia!

Eu levanto, tomo um café e passo o dia todo sem tomar água e sem me alimentar até às 2 horas da manhã, que é a hora que eu chego em casa. Eu troco um monte de comida, muito alimento, e o dinheiro que ganho com venda de frutas por drogas, em dinheiro gasto a média de R$ 200,00 ou cento e poucos reais por dia em crack. Chego em casa as 2 horas eu faço a minha única refeição do dia. Eu era um homem que pesava quase 80 quilos, to com 54 quilos e tenho 1,78 de altura. 

Como somente uma vez por dia, já cheguei a ficar mais de uma semana sem tomar banho. Agora to me cuidando mais, tomo banho diariamente, escovo os dentes sempre. Agora procuro deixar minha aparência mais ou menos razoável para poder abordar as pessoas para conseguir o que eu preciso, que é a droga!

Você falou que está cuidando de sua aparência, e isso se deve exclusivamente a conseguir drogas, ou existe um motivo diferente para isso, como o interesse sentimental e alguém?

- Eu cuido da minha aparência especialmente para conseguir a droga! Não é por mim, não é por ninguém, é só pela droga! Eu estou no fundo do poço! A gente descobre que tá num beco sem saída, quando a minha vida e a minha rotina, tudo é em torno da droga, tudo que eu faço é para conseguir a minha droga de preferência!

E eu estou nessa situação neste momento. Eu to nessa situação aí, a minha rotina é só para droga, eu cuido de mim para conseguir o que eu quero, que é enrolar as pessoas para conseguir meu dinheiro!

Você já levou algum susto por causa da droga (overdose)?

- Nunca tive! sou muito forte! Eu tomo medicação para dependência química desde os 16 anos. O Amplictil que é o laranja, longactil, se uma pessoa que nunca tomou, tomar meio Amplictil 100 miligramas fica, vou dizer na gíria, fica patinando por dois dias, fica bobo, leva um sossega leão. Injeção de haldol com Fenergan nem faz mais efeito em mim. Amplictil eu chegava tomar oito e não faz mais nada de efeito em mim. No caso aí, nem as drogas tem muito efeito em mim, até mesmo a pedra eu já preciso mais, no cachimbo eu fumo duas pedras juntas para conseguir o efeito que eu preciso.

Você tá dizendo que tem que usar duas pedras de crack, não existe alguma coisa mais forte que o crack?

- Por enquanto, ainda não!

Creio que isso até já tenha respondido com as questões anteriores, mas você tem alguma vida sexual?

- Tenho vida sexual sim! Eu me prostituo para conseguir droga. Tenho relações sexuais com um homossexual que me da às drogas. Eu vendo meu corpo por drogas!

Nada disso que você faz é por sentimento, é só com interesse na droga, a sua vida agora é voltada completamente para o vício?

- É só pelo crack!

Qual é teu maior medo?

- O meu maior medo é uma coisa dolorosa de falar, meu maior medo é perder a minha mãe! Porque eu fico pouco com a minha mãe, eu chego em casa minha mãe tá dormindo, ela só abre a porta para mim e me xinga, por vezes pega um pedaço de pau e quer me bater para ver se eu tomo juízo. Meu medo é dela faltar e eu ter a lembrança de não ter dado um abraço nela! De eu sair de casa e não ter convivido um pouco mais com ela, de não ter conversado, dividido as angústias dela. Eu tô judiando muito da minha mãe! Coitada da minha mãe, meu Deus do céu, eu não tenho o que falar, me faltam as palavras para dizer o que eu sinto. Imagino que a dor que ela sente, eu sou o único filho homem da família, tenho quatro irmãs e eu só de homem, ela nunca escondeu que ama mais eu que as minhas irmãs. Então ela sofre muito! Sou o filho preferido dela, ela me chamava de príncipe, isso é muito doloroso para mim, é meu maior medo. De perder minha mãe e ficar sozinho, sem ajuda.

Depois de falar tudo isso, como seria recebido por tua mãe e tuas irmãs uma nova tentativa de se limpar? Qual seria a reação de tua família?

- Minha família é só minha mãe!

Todas as vezes que eu me internei, a minha mãe que é uma guerreira, me deu total apoio, tanto financeiro, emocional, familiar, companheirismo. Então eu vejo ela dizendo que me da apoio total! E sempre vai me dar esse apoio enquanto ela tiver viva. Ela sempre falou para mim que quando eu quiser me internar, ela sempre vai estar do teu lado, nunca vai me abandonar! o dia que eu precisar de ajuda ela vai estar lá. Ela sempre disse para eu tentar largar, eu já tentei e falhei, é muito difícil, muito difícil!

Pode dizer uma coisa ou lugar que te traz boas lembranças de antes do vício?

- O ombro do meu avô! A segurança de quando meu avô era vivo!

Infelizmente, esse local é inalcançável, mas e se fosse o ombro de sua mãe, e você estando sóbrio, acha que algum dia poderia alcançar esse lugar e segurança novamente, e assim dar uma alegria a sua mãe?

- É como eu disse antes, por conta da separação dos pais, para mim sempre faltou aquela figura masculina na minha vida, já segurança também antes do meu avô morrer, eu vivi um caso quando eu tava bem crítico meu caso a dependência química, e fui posto para fora de casa. Fui morar com um homossexual que era gerente de uma banca de bicho. E foi a partir dali que eu me perdi totalmente. Porque além de eu ter um pagamento e estar seguro, ele me pedia para fazer alguns trabalhos relacionados à banca de jogo do bicho, além de fazer pagamentos, e cobranças, nesse negócio assim eu ganhava muito dinheiro fazendo favores. Eu ganhava mais ou menos R$ 500,00 por semana, fora o que eu roubava dele. Ele era um homem que falava assim: eu com menos de R$:10.000,00 no bolso muda até o jeito de caminhar!

Então roubava, em momentos de fissura de 2 a3 mil reais da bermuda dele e gastava tudo em droga e em máquinas caça-níqueis. Ali foi a minha perdição, ali eu usava muito!

O que você sente com o olhar das pessoas para ti?

- Eu já tenho umas frases prontas às pessoas, tem gente que já me conhece e olham com ares de discriminação, porque a minha imagem está deturpada devido ao uso do crack. Então o que eu fiz para lidar com a minha imagem deturpada?! O que eu vou confessar aqui é uma coisa que confesso ser muito difícil falar, porque quase ninguém sabe. Eu chego a mentir, eu vou dar um exemplo de como eu abordo as pessoas quando to vendendo fruta, eu chego assim: Boa tarde! Com licença senhor por gentileza. Só não vai bater em mim, não quero assustar, mas eu sou feio assim porque eu tenho HIV!

Assim eles vinculam a minha imagem deturpada a doença. Então as pessoas associam a imagem a um doente e não a um viciado. Ser alto e magro, esquisitão, só pele e ossos, faz com que liguem você a imagem do aidético, então as pessoas se comovem com a minha aparência e com meu trabalho, e daí eles não compram uma fruta de mim, mas me dão o dinheiro! O cliente dá o dinheiro e não leva uma fruta, e eu ganho mais para comprar pedra. Por isso que eu minto para as pessoas que eu tenho AIDS para ter desculpa da minha aparência!

Tem alguma coisa que você queira falar para o pessoal que está lendo está matéria?

- O vício que eu deixei me dominar, à vontade quando dá , é algo terrível, a vontade é a vontade da alma, é a alma que fica doente! A vontade é tão intensa, que a força com que o corpo pede é tão intensa que é algo tenebroso. Mas eu digo assim no meu caso, eu não desisti de mim ainda! Sei que a raça humana está sempre em constante evolução, e que eu não estou passando pelo que eu to passando hoje em vão! Eu tô passando por isso porque eu acredito que eu tenho que passar por isso, que isso é a minha missão, tenho que vencer isso e acho que minha missão é viver limpo!

Eu acredito em reencarnação, e que isso eu vou encarnar várias e várias vezes, com esse mesmo problema que eu tenho hoje, para tentar sair e tentar viver uma vida limpa e servir de exemplo.

Resumindo assim, a minha frase de vida diz assim: Enquanto há vida há esperança!

É isso que eu penso, enquanto a vida, não desista!

E o meu recado que vai para os jovens, as primeiras vezes tudo é festa, tudo é alegria, sensações parecem ser extremamente prazerosas, vocês acham que essa sensação é incomparável, e isso pode trazer curiosidades, e não quero despertar curiosidade em quem nunca usou porque as sensações que dizem ser ótima e que leva ao céu são pura ilusão! É tudo mentira!

Como alguém que vive no meio, você acredita que existe alguma forma de resolver o problema, não da droga em si, pois sempre vão existir viciados e quem forneça o vicio, mas sim o problema da violência, do roubo, de morte de inocentes, de crianças andando com drogas, andando com dinheiro, com armas, de pessoas escondendo em carrinho de bebê drogas para sair de batidas policiais, e várias coisas desse gênero que podemos presenciar quase que diariamente?

- Olha isso é uma pergunta muito complexa e isso seria como as pessoas que teriam muito mais conhecimento além de mim para responder. Mas o meu ver eu acho que a legalização da maconha para mim é viável só que as outras as drogas mais pesadas não. Mas não tenho uma resposta melhor para te dar.

A Legalização da maconha, não acaba sendo uma porta de entrada para outras drogas mais pesadas?

- Muitos falam que os jovens começam na maconha e depois partem para o pó, mas não é assim ao meu ver. Creio que em primeiro vem à bebida, pois a única coisa que tira tonturinha da bebida é a cocaína!

Cheirar uma linha de cocaína, quem tá bêbado cura, cheirando pó para ficar lúcido e não se parecer bêbado. O efeito da bebida sai na hora. E por conta da bebida eles conhecem outras drogas como a bala (ecstasy), doce ( LSD) e por elas os jovens chegam ao crack.

Eu fazia um trabalho com jovens, fazia reuniões de matriciamento quando eu era redutor de danos na minha casa para menores de 12 a 16 anos, no qual a gente se reunia para cantar, para ler livros, contar histórias e era uma reunião de 2 horas onde fazíamos um cafezinho para as crianças, refrigerantes, pastéis, de tudo, e ali tínhamos campanhas antitabagismo, antialcoolismo e antidrogas. No caso a gente tentava fazer a cabeça e mostrar para as crianças que eu ia buscar na periferia, eu pessoalmente com as técnicas junto no carro. A gente ia catar essas crianças em lugares mais sinistros que vocês podem imaginar, a gente tirava da casa de traficante, e com desculpa que é só para tomar cafezinho, beber refrigerante, que era uma festinha. E eu parei com esse serviço, porque estava sendo ameaçado por traficantes! Parei de fazer essa ação, que era uma ação de inclusão social para menores, que até hoje fico sentido que eu fazia por bem, como me sentia bem fazendo isso! Mas tivemos que interromper devido ameaças de traficantes.

Aproveitando esse assunto, como funciona esse meio do tráfico? A gente vê que tem muita morte, muita coisa, mas muitas vezes não entendemos como isso funciona. Você, como usuário, já chegou a ser ameaçado alguma vez?

- Com certeza! Já fiquei, só que eu tive muita sorte. Eu cheguei ficar devendo R$ 2000,00 e eu morava com o gerente da banca de bicho, ele pagou para mim, mas fui mais que ameaçado de morte, botaram um revólver na minha cabeça e fizeram roleta-russa comigo! E muita pressão psicológica para eu conseguir o dinheiro. Me deram um prazo de 5 dias, eu consegui 2 dias, paguei tudo! E eles ainda me deram o malote de R$:300,00 que são 60 pedras porque paguei logo a conta.

Você conhece alguém que esta sendo ameaçado neste momento por estar devendo?

- Conheço sim, um trabalhador, um pedreiro. Pedreiro no caso de construir casas. Ele tá devendo R$ 4000,00 com agiota na boca de tráfico aqui. A vida dele está por um triz, esse agiota gasta até 5 mil para matar esse trabalhador que tá devendo R$ 4000,00. Ele não se importa de gastar 5 mil para mandar matar ele, pode acontecer a qualquer momento, ele está por um fio!

Então quer dizer que o valor de uma vida seria em torno de R$ 5000,00?

- Não! Na ideia do traficante uma vida de usuário custa R$ 5,00! Aqui na cidade já aconteceu de um amigo meu que morreu por causa de R$ 5,00! Mas é muito difícil, em outros lugares, cidades maiores, a vida custa até menos de R$ 5,00! Essa é a dura realidade!

***

Acabei a entrevista neste momento, até acho que se eu quisesse escavar mais fundo ele teria mais coisas assustadoras relacionadas a violência do meio onde vive, para falar. Mas achei melhor não prosseguir, pois com o que já havia conseguido nas respostas já mostra uma boa parte da realidade dos dependentes químicos.

Desta vez não vou deixar minhas considerações no final do texto, mas peço para vocês que leram deixar as suas considerações sobre a entrevista.


Afinal, quanto realmente vale uma vida?



( Fonte Google Imagens- Imagem ilustrativa)



Matéria redigida por: Mário Resmin
Para publicação exclusiva em: Não Entre Aqui
Revisão de: Camila Cruz
Todos os direitos reservados ao autor, fica proibida a copia sem autorização do autor.

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